Tenho pêlos no peito e uma portentosa
afro. As minhas calças à boca-de-sino azuis clarinhas contrastam com a minha
estilosa camisa roxa aberta até ao umbigo. Só pausa. Saco mãos cheias de
miúdas, noite após noite. Sou um animal na pista de dança, ela é o meu habitat.
E vou gingando por entre damas de mini-saia e sapatos de plataforma brancos.
Suor, dança e luzes coloridas. Os meus braços fazem movimentos fluidos e
vigorosos acompanhado as investidas pélvicas que explodem da minha cintura. E
domino o mundo. Nada me toca entre o fumo e as luzes de uma pista de dança num
clube nocturno manhoso onde só sinto o estilo que me escorre pela testa depois
de uma arriscada pirueta em forma de paço de dança. E é aí que dou uma chapada
no candeeiro, fico à rasca da mão, e lá tenho de voltar a ir para a cama.
Caso não me explicasse, muitos de
vocês poderiam estar a pensar que tinha gravíssimos problemas mentais, mas
calma, isto só acontece quando Touch the
Sky, do meu amigo Kanye West, me toca nos ouvidos. Afinal há melhor personificação
do bombanço do que dançares feito maluco, semi nu, no teu quarto às escuras,
enquanto uma espectacular faixa como esta do amigo West te infecta as veias e os
músculos? Óbvio que não!
Voltando ao que importa, falamos
de Touch the Sky, faixa número três
do segundo álbum de originais do excêntrico rapper de Chicago, Late Registration (2005), com a
participação especial do não menos brilhante Lupe Fiasco. Tendo como beat
primário uma composição extraída directamente de outro grande mestre do funk/soul,
o Sr. Curtis Mayfield (Movin on Up),
a música, na altura, aterrou no meio de nós como uma bomba. Numa altura
estranha do hip-hop, onde por um lado tínhamos aqueles ainda fieis à velha
lengalenga do West Side Vs. East Side, e por outro, tínhamos um híbrido
estranho de R&B, hip-hop e soul, este álbum como um todo e esta música em
particular marcaram o início de um novo capítulo na história deste género
musical, criando musicas super ritmadas, com fortes influências do soul de
outros tempos e, mais importante ainda, com letras robustas que muitas vezes
abordava problemas sociais, por exemplo, como no caso de outra grande malha do
mesmo LP, Diamonds From Sierra Leone.
Sem discussão, instrumentalmente esta música é um portento do catano. No que
toca à letra em si, temos uma interessante narrativa sobre o próprio Kanye, que
com armas de destruição maciça vocais faz-nos um tour da sua complicada vida e não menos simples, início de
carreira, deixando sempre latente a convicção de que iria um dia tocar o céu. E
assim foi.
Outro destaque vai para o
videoclip que acompanhou esta faixa, que se visto de relance, pode te levar a
crer que estas perante um trailer de
um qualquer filme de Hollywood. Provando que muitos millions fazem a diferença, West criou uma história com ajuda de
Chris Milk (director) inspirada no mítico acrobata americano Evel Kenievel dos
anos 70, onde o jovem da Windy City
interpretava um Evel Kanyevel. Até a Pamela Anderson pousou a boia vermelha para
dar uma mãozinha no vídeo! O resultado foi mais que positivo, apesar de alguns
problemas legais com o Evel original, mas tudo acabou bem.
Acima de tudo isto, esta música é
o estandarte de um hip hop mais rico, de outros tempos, em que não importava o
número de bitches que tinhas debaixo
dos braços mas sim coisas como questões raciais ou outros graves problemas
sociais. Bombava não só o corpo como a cabeça. E disso já não há muito.
Mas como estamos em semana de
festa, deixo-vos a dica: ponham esta música a tocar no vosso quarto, apaguem a
luz e ponham-se à vontade. Deixem esta energia intoxicar-vos e libertem todo
esse stress através de passos de
dança manhosos ou espetaculares. Ninguém vai ver. Toquem o vosso céu e pode ser
que sejam apresentadas ao moço de que falo no início desta mui bonita crítica.
Texto por Diogo Lopes
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