Bicos, ácidos e decibéis : PARTE I

Antes de mais, façamos uma viagem ao mundo dos amplificadores e altifalantes. Deus, por esse mundo fora, é decerto um gajo amigo da sua guitarra acústica e fã de folclore. Mas afinal quem é o diabo, ou quem são eles?  Já lá vai o tempo em que Jimi Hendrix era o nome que jamais deveria ser pronunciado, em que eram perseguidos os que fossem apanhados a escutar o vinil rosa, dos My Bloody Valentine, e em que havia cadeia para quem cantarolasse umas notas duns Napalm Death ou Burzum. Então, e hoje em dia? Que artistas andaram a fazer chorar os bebés Marshall e a preocupar as mamãs Orange, nessa que foi a primeira década do século XXI?
Para celebrar os 666 likes na página do Facebook do Edição Limitada, nos próximos dias trarei-vos uma selecção de 10 dos melhores trabalhos que se lançaram na actualidade da música mais porca, barulhenta e pesada. A definição de música do demónio é vasta. Para uns são as letras satânicas e os riffs gelados, para outros é escutar a masturbação duma guitarra de 8 cordas. Por cá os critérios serão a capacidade de fazer sangrar tímpanos, deslocar órgãos vitais, impossibilitar o sono e afastar o sexo oposto... ou não. Seja drone, noise, electronica, shoegaze ou sludge... vale tudo. Apresento-vos a primeira de 5 partes do que quer que seja isto.

Merzbow - Dharma
Merzbow será decerto o primeiro nome a surgir em muita cabeça ao se falar em "noise". Masami Akita, com já 54 anos e mais de 350 lançamentos, é provavelmente o mais conhecido e respeitado artista do género. Álbuns como Venereology (1994) e 1930 (1997), tornaram-se em verdadeiras bíblias para os fãs do estilo. São  dantescas as paredes de som distorcido presentes na grande maioria dos seus trabalhos, de difícil digestão também, sim, mas provavelmente representam a última fronteira no que toca à chamada música extrema. Apesar de longos anos no activo, o artista japonês nunca parece ter abrandado realmente o ritmo, e este Dharma (2001) é prova disso. Digamos que escutar uma sessão de amor sadomasoquista entre pianos não deve andar muito longe disto. Não é para qualquer "estômago", é abrasivo, é barulhento... é noise.

Nadja - Touched
Um perfeito exemplo de que a música intensa, pesada ou como a queiram chamar, pode também ser bela e dotada duma estranha elegância. Os Nadja são um duo originário de Toronto, constituído por Aidan Baker e por Leah Buckareff, sendo donos duma sonoridade que navega pelo drone, ambient e shoegaze. Pondo a coisa de outra forma, imaginemos uma colaboração entre uns Sunn O))) e Godflesh, que veio a ser mais tarde interpretada pelos My Bloody Valentine (se é que isto faz sentido cronologicamente). E voilá, talvez obtivessem algo semelhante ao já chamado "dreamsludge", do casal. Touched, o primeiro longa-duração dos canadianos foi lançado em 2002 pela Alien8 Recordings, e é, no meio de dúzias de outros álbuns, colaborações, splits e EPs, um dos derradeiros trabalhos do duo. Desde logo destacaram-se pelas grandes muralhas de guitarra, pela bateria programada a rebentar no fundo e pelos vocais tão típicos do shoegaze ou mesmo dream pop. Destaque concedido a "Stay Demons", uma verdadeira sessão de hipnotismo que se prolonga por cerca de 10 minutos, aberta a quem quer que se deixe levar e envolver.

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