CHELSEA WOLFE em entrevista.


A palavra apocalipse, do grego αποκάλυψις, significa revelação. Ora, pode ser exactamente essa a palavra mais correcta para definirmos a conversa que trocámos com Chelsea Wolfe, uma female singer que não tenta ser apenas mais uma menina bonita com vontade de cantar. “Eu sou bastante melancólica, quase maníaco-depressiva na minha vida diária e isso não é muito diferente no meu «eu» em palco. Também sou bastante tímida”. A este quadro que a própria pinta de si, sentimo-nos forçados a acrescentar-lhe a simpatia e a amabilidade com que nos deixou entrar na sua bolha “prisional”: “Eu normalmente passo muito tempo sozinha, um pouco como um recluso.”
Se tantas vezes exaltamos um paraíso terrestre, Chelsea Wolfe já encontrou esse seu lugar. Mas atenção, de paradisíaco nada tem. Chelsea – sim, tratamo-la pelo primeiro nome, ficou nossa amiga – vive num mundo diferente, sente-se confortável no inferno de elementos que cria em Mer, tema em destaque no seu segundo lançamento, αποκάλυψις (aka Apocalypse). Música vinda das trevas, assim podemos adjectivar um som que é como uma banda sonora do demónio – parece que esta entrevista não podia sido mais certeira altura e realmente não podia. “Há algumas coisas que sempre foram fontes de inspiração para mim, por exemplo, a escuridão da Natureza ou a ideia de universos paralelos, a história nórdica e a linguagem bíblica, todas essas coisas guiam o meu sentido estético. E acho que essa estética visual é importante para um músico”.
Quantas vezes definir alguém como uma “pessoa normal” não pode ser o melhor elogio? Chelsea Wolfe parece ser uma pessoa normal. Tinha o bichinho da música, aprendeu guitarra e foi para o fim da fila, mas já se tem chegado à frente. O primeiro LP, The Grime And The Glow (ouçam Moses aqui em baixo), lançado ainda em 2010, está envolto, segundo a autora, de um espírito despreocupado: “O primeiro LP foi feito de um modo não linear, de uma forma orgânica... Eu andava apenas a levar as oito faixas a diferentes sítios, gravando com diferentes pessoas que não tinham qualquer preocupação se as canções iriam alguma vez ser tocadas de novo ao vivo. Depois do lançamento do LP, comecei a tocar ao vivo com banda e as coisas começaram a parecer-me mais consistentes. As canções que íamos escrevendo eram também tocadas ao vivo e acabaram por figurar no segundo álbum”. O que é certo é que com ou sem grande preocupação as coisas se foram realizando e Wolfe é hoje um nome que irão, com certeza, voltar a ouvir falar.

Apocalypse justifica isso mesmo. É um álbum impróprio para incontinentes, cardíacos ou crianças que ainda acreditem no Pai Natal. O próprio Diogo Lima confidenciou-me, ainda há dias, que tinha mesmo pingado a sua sunga ao ouvir Chelsea Wolfe. E com razão. É música do além, a criação de toda uma atmosfera visual fantasmagórica, tudo muito gótico, ligeiras pitadas que vão desde um certo experimentalismo até um blues meio acabrunhado. O resultado deixa-nos rendidos.
Fomos ainda a tempo de saber que Chelsea recentemente mudou de casa – "Eu acabei por me mudar do Norte da Califórnia para Los Angeles no fim do ano passado. Adoro morar aqui, é fácil de ter todo o trabalho feito e acaba por ser um lugar estranho, muitíssimo inspirador.” – e que tem vindo também a mudar a sua relação com o palco – “Levou-me algum tempo a sentir-me confortável em palco, mas claro, quantos mais concertos fazes, mais habituada ficas. E à medida que dou mais concertos, mais me divirto neles! E também fiquei a adorar conhecer novas pessoas e novos fãs.” A nós ainda não nos mudou a vida, mas já nos deixou com o coração quente. Obrigado, Chelsea.
artigo por Afonso Sousa

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